segunda-feira, 4 de março de 2013

Elogio da solidão

Venho do país da criação coletiva. Na Colômbia, a história do teatro está profundamente ligada à necessidade de se agrupar. E esse fato é absolutamente político. Nosso teatro apareceu com força no contexto universitário, sindical e obreiro. Pensar no teatro colombiano é pensar em grupo. É essa minha herança, minha orgulhosa herança.
No entanto, meu percurso me levou por outro caminho. E acho que essa eleição também constitui um ato de transcendência política. Decidir trabalhar em solidão quando se pertence ao mundo do teatro parece um contrassenso. "Como? Sozinho? Sozinho mesmo? Por quê?". Essas são perguntas que constantemente me são feitas.
Poucos críticos questionaram os exercícios criativos de escritores que decidiram trabalhar na construção coletiva de um romance. De fato, foram elogiados pela contemporaneidade da proposta colaborativa. Ninguém questiona a necessidade de associação quando se parte de uma situação de solidão, mas quase todo mundo o faz quando se trata do processo contrário.
Hoje, eu estou aqui. Sozinho na tarefa de criação. Procurando um estado que é realmente difícil e inalcançável como um absoluto. Mas tentando um encontro com meu eu artista -que pouco espaço teve no meu passado-, ocupado como estava da labor de interpretar os interesses de outros. A coletividade não estava me permitindo encontrar esse espaço. Acredito que, como assinala Gaston Bachelard, "A solidão é necessária para nos desvincular dos ritmos ocasionais". Além disso, o filósofo francês diz que "Ao nos colocar diante de nós mesmos, a solidão nos leva a falar conosco, a viver assim uma meditação ondulante que repercute por todas partes suas próprias contradições e que procura incessantemente uma síntese dialética íntima". Eu espero que a encenação que está se formando nesta pesquisa alcance esse estado de síntese dialética. 
Sim, venho do país da criação coletiva. Minha pesquisa não se separa de jeito nenhum da minha tradição teatral. De fato, ela é quem me permite esta licença. Com esta solidão, estou fazendo uso do meu direito ao no man's land, àquela segunda existência que Jean François-Lyotard considera fundamental para se encontrar consigo mesmo e que pode ser entendida como aquele direito a permanecer separado, a não ter que responder aos outros. Já chegará o momento do encontro com o público. Daqui a pouco terão notícias disso.

2 comentários:

  1. Confesso que ao conhecer e residir na mesma casa que um colombiano que estudava o processo artístico solitário do ator me espantou um pouco. Logo que venho de uma escola em que várias práticas artísticas se permeiam entre criações coletivas e processos colaborativos e, tenho como uma das referências 'Teoria e Prática do Teatro' de Santiago Garcia, diretor colombiano e adepto do processo coletivo de criação. Entretanto, o trabalho de Juan evoca uma individualidade que, muitas vezes, se perde nesse amontoado de criadores. A solidão na criação precisa ter seu espaço e, porque não dizer seu respiro. Creio que através da pesquisa de Juan, vários artistas procuraram encontrar no âmago de si a motriz para criar suas próprias histórias e construir suas próprias cenas.

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  2. Parabens Juan, muito belo e desafiante exercicio.
    Deveras ancioso para o encontro (resultado e publico) oportunidade de acessar as reverberaçoes deste contato hibrido: Pessoa X Artista X self.

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