terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Teaser Meus caros amigos



Para meus queridos leitores, que não têm ainda uma ideia do que foi a primeira versão do espetáculo Meus caros amigos, compartilho o primeiro teaser. Adoraria ler suas opiniões.
 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

O ator e a sua autonomia

Autonomia não é uma palavra que seja aceita com tranquilidade quando se fala do trabalho do ator. Há quem fala que sempre atrás de um bom ator encontra-se um bom diretor. Eu não brigo com essa ideia. De fato, concordo na maioria dos casos. No entanto, essa dependência não tem que ser um absoluto e já vi muitos casos de atores autônomos que, como poucos, são mestres de seu ofício.
Quando alguém debate comigo minha proposta, quase sempre se concentra nesse assunto. Para os que acham que os atores precisam de guias externos o tempo todo ou que não têm condições de andar sozinhos pelos caminhos da criação cênica, na continuação, algumas frases que vão adorar. Mas estas frases também são para os que, como eu, acreditam que nem sempre precisamos dessa dependência (eu também as adoro... rsrsrsrs...). Divirtam-se:

  • “O ator digno deste nome não se sobrepõe ao texto. Ele o serve. E servilmente” (Jean Vilar).  
  • “Os atores servem para interpretar todos os caracteres porque não têm nenhum” (Denis Diderot)
  • “A final, no teatro, talvez seja necessário e suficiente que o ator tenha a ilusão da liberdade. E poderia ser diferente? A escolha primordial de todo ator não é precisamente se alienar, mergulhando no papel? A arte do ator tal vez comece por esta renúncia” (Jean Jacques Roubine).
  • “O ator só tem uma arte de criação autêntica: a mímica” (Jean Vilar).
  • “O ator deve ser, e deve ser tão somente, o veículo de uma nova linguagem” (Antonin Artaud).
  • O ator deve sair do teatro e em seu lugar surgir a figura inanimada, a Supermarionete" (Gordon Craig).

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

"Espetáculo unipessoal como espaço criativo" em Porto Velho (RO)

Nos dias 24 e 25 de setembro, aconteceu a oficina "Espetáculo unipessoal como espaço criativo" dentro da programação da Mostra Palco Giratório do Sesc Rondônia. Na cidade de Porto Velho, tive a oportunidade de conduzir essa oficina com um grupo de atores e dançarinos muito talentosos. Foi um experiência única que deu para esclarecer muitos elementos desta pesquisa.



Os alunos também assistiram a palestra "Pressupostos teórico para o trabalho unipessoal", na qual discutimos vários temas que têm a ver com o trabalho e as funções do ator e as motivações para pensar a autoria no teatro a partir das potencialidades do espetáculo unipessoal.

Além disso, o espetáculo Meus caros amigos foi a presentado no dia 21 de setembro. A Sala Um do Sesc Rondônia abriu as portas ao espetáculo. A recepção do público não poderia ter sido melhor. Na continuação, o link sobre uma matéria produzida dentro da programação da Mostra.

http://g1.globo.com/ro/rondonia/noticia/2013/09/ator-colombiano-traz-porto-velho-monologo-sobre-homossexualidade.html

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Estreia "Meus caros amigos"

Amigos, o espetáculo Meus caros amigos, produto desta pesquisa, teve sua estreia ontem no Teatro Martim Gonçalves da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, Salvador (BA), Brasil. A temporada continuara até 15 de setembro, 20 h. Sessões extra sexta, sábado e domingo, 17 h. Aqui, algumas das imagens capturadas pelo fotografo e amigo Diney Araujo. Como sempre, à espera dos seus comentários...








sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Monólogo, solo ou espetáculo unipessoal?



Varias pessoas têm me perguntado porque estou usando a expressão espetáculo unipessoal para me referir a Meus caros amigos. Algumas, inclusive, associaram a palavra unipessoal com um tipo de criação que partiria de inquietações pessoais; mas não tem a ver com isso, embora ache essa acepção interessante.
Quando pensei no tipo de espetáculo que queria fazer, me deparei com uma série de termos que, em muitos casos, falavam mais ou menos das mesmas experiências: monólogo, solo, monodrama, unipessoal e solilóquio, entre muitas outras. Algumas delas foram descartadas por sua relação exclusiva com o discurso verbal, outras por definir características muito específicas de gêneros teatrais. Finalmente, "classificaram" as três que dão título a esta postagem.
A palavra monólogo é, na minha língua, o termo comum para chamar os espetáculos que têm um só ator em cena, no entanto, sempre associada ao discurso verbal. Por esse motivo, resulta insuficiente para determinar o tipo de espetáculo que poderia sair desta classe de experimentações, tendo termos aparentemente mais amplos, como o usado habitualmente no Brasil – solo – ou o que ganhou força nos últimos anos na língua espanhola – obra unipersonal (espetáculo unipessoal).
Por outro lado, a expressão solo parece ser muito mais comum nas áreas de música e de dança. Uma rápida consulta no dicionário de língua portuguesa Aurélio demonstra a existência apenas de duas acepções relacionadas com a arte para a palavra: “Trecho musical executado por uma só voz ou um só instrumento” ou “Bailado executado por uma só pessoa”. Além disso, no mesmo sentido de monólogo, solo pode fazer referência tanto ao todo quanto à parte de uma peça musical ou de dança. Por isso, o termo usual na língua espanhola resulta mais específico. Ao falar de espetáculo unipessoal, a ideia de totalidade fica mais definida, motivo pelo qual decido, a partir deste momento, usar esta nomeação. O que acham desta decisão? Espero seus comentários. 

sábado, 17 de agosto de 2013

Leve: um obra de Fredy Alzate

Nem tudo pode ser em absoluta solidão. Precisamos de ajuda nas coisas que não fazem parte das nossas competências. Por isso, o artista colombiano Fredy Alzate fez sua contribuição ao espetáculo Meus caros amigos, o qual sustenta esta pesquisa. Inspirado na proposta cênica, pintou o obra intitulada Leve. Trata-se de uma pintura feita em acrílico sobre tela, que parte de uma das imagens que compõem a encenação. Ela será a imagem de cartazes e programas de mão.
Fredy consegue captar a essência do espetáculo num gesto que traduz muito bem minhas intenções como ator deste espetáculo unipessoal (numa próxima postagem compartilharei com meus leitores por que renunciei ao termo solo e decidi usar o de unipessoal). Espero que esta imagem motive mais àqueles que assistirão a temporada de estreia.
O que acham do trabalho de Fredy Alzate? Quais ideias sugere a pintura? O que tem a ver isto com O ator em solidão? Gostaria muito de ler suas opiniões.


domingo, 14 de julho de 2013

E os ensaios continuam...

Meus caros amigos já tem data de estreia: 11 de setembro no Teatro Martim Gonçalves da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia (Salvador, BA). Por enquanto, uma prova de que os ensaios continuam...





quinta-feira, 20 de junho de 2013

Oração a São Sebastião

Quem me conhece sabe que não sou católico, nem professo religião nenhuma. Mas não posso negar que fui educado num contexto altamente religioso e que meu gosto pelas ficções começou com duas referências básicas: os contos de fadas e as histórias dos santos. Minhã mãe ganhou várias vezes as olimpíadas bíblicas na sua escola (sim, existiam essas competições). Por isso, sabia muitas das histórias desse livro maravilhoso e de outros relacionados com os dogmas da sua fé. As histórias dos santos são maravilhosas e cheias de façanhas. Nesse sentido, nada diferentes das de fadas, príncipes e dragões (algumas, inclusive, têm esses seres mitológicos também). Pois bem, tudo isto para falar da referência que vocês, leitores, já devem ter percebido: São Sebastião.
Ele chegou no meu processo por ser ícone da comunidade gay. Mas sua história é bem interessante. Não a contarei agora, mas encontrei a oração dedicada a este santo e acho que será muito bom ter ela na minha encenação. Imaginam como será levada à cena? Aceito sugestões...

Glorioso mártir são Sebastião, soldado de Cristo e exemplo de cristão. Hoje nós viemos pedir vossa intercessão junto ao trono do senhor Jesus, nosso salvador, por quem destes a vida. Vos que vivestes a fé e perseverastes até o fim, pedi a Jesus por nós para que nós sejamos testemunhas do amor de Deus. Vós que esperastes com firmeza nas palavras de Jesus, pedi a ele por nós para que aumente nossa esperança na ressurreição. Vós que vivestes a caridade para com os irmãos, pedi a Jesus para que aumente nosso amor para com todos. Enfim, glorioso mártir são Sebastião, protege-nos contra a peste, a fome e a guerra; defendei nossas plantações e nossos rebanhos que são dons de Deus para o nosso bem, para o bem de todos. E defendei-nos do pecado que é o maior mal, causador de todos os outros. Assim seja.

(Tomada de O livro dos santos, de Carolina Chagas)

domingo, 9 de junho de 2013

Uma solidão acompanhada

Estes são meus caros amigos, aqueles que me acompanham na solidão dos meus ensaios. Diz Bachelard que "A consciência de estar só é sempre, na penumbra, a nostalgia de ser dois". Talvez, no meu caso, seja uma nostalgia de ser muitos...


"Meus caros amigos serão eternamente jovens na minha memória, belos como a mais prazerosa das lembranças... Meus caros amigos não têm medo da dor. O amor para eles nunca foi tortura. Meus caros amigos olham para o céu enquanto estão pecando..."

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Uma imagem motivadora

Prezados leitores,

O projeto O ator em solidão não para. Hoje gostaria compartilhar que o espetáculo já tem título: Meus caros amigos. Daqui a pouco, estarei publicando a data da estreia. Fiquem ligados. Por enquanto, deixo para vocês uma imagem que faz parte dos pontos de partida desta criação: o São Sebastião de pintor mexicano Ángel Zarraga. O que acham? De que fala esta imagem para vocês? Espero seus comentários...

domingo, 28 de abril de 2013

O monstro sagrado

Os variados debates que aparecem quando compartilho os objetivos da minha pesquisa com outros atores ou diretores de teatro deixam no ar uma atmosfera cheia de escuras nuanças... Sempre achei isso o melhor daqueles diálogos. No entanto, uma dessas nuanças que aparece constantemente continua me incomodando: a impressão da autossuficiência e de uma alta dose de egolatria. É como se aquela busca pela singularidade dentro de uma arte tradicionalmente coletiva fosse um pecado ou uma espécie de transgressão contra o mais sagrado do teatro.
Pensando minha aproximação como um sacrilégio, lembrei daqueles atores do final do século XIX e começos do XX, cujos egos lhes deram grande recordação. Alguns chamam eles de vedetes -acho que a palavra só tem feminino (algum leitor pode me tirar esta dúvida?)-, mas eu gosto mais da expressão "monstros sagrados" para nomeá-los. Sim, falo de Sarah Bernhardt (1844-1923), Henry Irving (1838-1905) e Eleonora Duse (1858-1924), entre outros.
Jean-Jacques Roubine diz que a arte destes atores se baseava indiscutivelmente no narcisismo, mas que isso não impede reconhecer a grandeza e a beleza do seu trabalho. Observados como fenômenos, estes monstros serão lembrados como grandes singularidades, são referência obrigatória na história do teatro e alvo de grandes ficções.
Não quero ser um novo monstro sagrado. Para sê-lo, precisaria de um talento excepcional e de mudar o foco da minha pesquisa em direção de um tema que considero anacrônico. Tenho certeza que muitos dos atores que trabalham na minha linha também não têm esse desejo. Não há em mim um instinto exibicionista maior do de qualquer ator. Mas há um grande desejo de potencializar as possibilidades de um exercício criativo que aproveite minha singularidade... Isso faz de mim um monstro? Ou, por acaso, um fenômeno? Infelizmente, não um prodígio, a outra acepção da palavra monstro. Qual é sua opinião sobre essas figuras? Espero alguns comentários sobre eles...

sábado, 20 de abril de 2013

VI Encontro Internacional de Mestres e Escolas de Teatro do Equador

A Universidade Central do Equador realizou o VI Encontro Internacional de Mestres e Escolas de Teatro em Quito do dia 1 de abril ao dia 6 do mesmo mês. O evento reúne grupos, companhias, escolas e mestres de teatro de vários países. Este ano o encontro contou com a participação de convidados de países como Equador, Colômbia, Brasil, Argentina, Chile, México, Venezuela, Costa Rica e Itália.
Fui convidado como mestre e, assim, o projeto O ator em solidão fez parte deste interessante evento. A oficina ministrada foi chamada O ator-autor. Uma proposta para o ator contemporâneo. Nela, foram discutidos vários assuntos, entre eles, a questão da autoria no teatro, a autonomia criativa do ator que prescinde do diretor e a potencialidade do espetáculo unipessoal. Participaram atores e estudantes de teatro do Equador, da Colômbia, da Argentina e da Costa Rica. Foi um espaço de discussão e criação maravilhoso.
O mais destacado desta oficina foi, sem dúvida, o encontro de diversas singularidades. Pegando as palavras de Renato Ferracini, a oficina me demonstrou a potencialidade do espetáculo solo para coletivizar a singularidad.
Nesta postagem gostaria de compartilhar algumas das fotografias tiradas durante a oficina e deixar na mente dos meus leitores, pelo menos, alguns dos rostros que participaram. Agradeço afetuosamente a Jorge Mateus, diretor do Programa de Teatro da Universidade Central do Equador e organizador do evento, pelo convite e pela generosidade.






 








terça-feira, 26 de março de 2013

Primeira apresentação pública

Como prometido, a primeira saída da sala de ensaio do processo de pesquisa O ator em solidão aconteceu. Foi no dia 19 de março de 2013 às 14:00 horas na sala 5 da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia em Salvador (Brasil). No contexto da  disciplina Processos de encenação, conduzida pela professora doutora Sonia Rangel, tive a oportunidade de ter um primeiro encontro com público. 
Neste ponto da pesquisa, apareceu um princípio criador que pode explicar muito bem a prática que estou desenvolvendo: a multiplicidade. Inicialmente inspirado nas propostas de Ítalo Calvino, entendo este princípio a partir das múltiplas e complexas maneiras de abordar a criação artística. Embora Calvino use o termo para entender os alcances da literatura contemporânea, a questão pode abranger as diferentes expressões artísticas. No meu trabalho, as variadas referências que me inspiram no momento da criação fazem com que a obra cênica seja possível. Minhas experiências, leituras e uma série de obras plásticas e musicais que me comovem são convocadas no momento do ato criativo. Assim, o interesse da prática apresentada na sala 5 foi trazer todos estes elementos de maneira material e não só metafórica.
27 versões pictóricas de São Sebastian – correspondentes a autores de diferentes nacionalidades, épocas e estilos – e três textos chaves – dois de André Gide (extraídos do romance O imoralista e do tratado Corydon) e um de Gaston Bachelard (O direito de sonhar) – foram pendurados num espaço cênico delimitado, visualmente, por uma atmosfera de luz e, sonoramente, por três peças musicais – o Erbarme dich, sein Gott de Johann Sebastian Bach, a Habanera de Georges Bizet e uma versão musical do poema de Federico García Lorca Gacela del amor que no se deja ver, cantado por Carlos Cano –. Todas essas referências contribuírem como pontos de partida para a criação da encenação que ainda não tem título e que, agora, começa a ter uma estrutura particular.
Pensando aquele espaço como encontro com meu eu poético, e depois de ter seu primeiro encontro com o público, entendo que ele me representa como sujeito artista. Finalmente, é a suma de uma série de experiências selecionadas a que faz com que essa prática seja possível. Para os propósitos da minha pesquisa, Ítalo Calvino se constitui como um autor fundamental na medida que reconhece esses procedimentos como legítimos. Um exemplo claro disto pode se perceber quando expõe as seguintes questões para responder ao reclamo de que a multiplicidade poderia afastar a obra do seu autor: “[...] quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras, de imaginações? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis”.
A continuação, uma primeira imagem da experiência. Espero que os leitores deste blog comecem a ter uma ideia do que será isto cenicamente. Agradeço à professora Rangel, ao  professor doutor Luiz Marfuz (meu orientador), a Germán Guevara (meu companheiro de vida), a Júnior Lópes (meu amigo) e a P. H. Dias (meu colega) por sua colaboração e comentários.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Elogio da solidão

Venho do país da criação coletiva. Na Colômbia, a história do teatro está profundamente ligada à necessidade de se agrupar. E esse fato é absolutamente político. Nosso teatro apareceu com força no contexto universitário, sindical e obreiro. Pensar no teatro colombiano é pensar em grupo. É essa minha herança, minha orgulhosa herança.
No entanto, meu percurso me levou por outro caminho. E acho que essa eleição também constitui um ato de transcendência política. Decidir trabalhar em solidão quando se pertence ao mundo do teatro parece um contrassenso. "Como? Sozinho? Sozinho mesmo? Por quê?". Essas são perguntas que constantemente me são feitas.
Poucos críticos questionaram os exercícios criativos de escritores que decidiram trabalhar na construção coletiva de um romance. De fato, foram elogiados pela contemporaneidade da proposta colaborativa. Ninguém questiona a necessidade de associação quando se parte de uma situação de solidão, mas quase todo mundo o faz quando se trata do processo contrário.
Hoje, eu estou aqui. Sozinho na tarefa de criação. Procurando um estado que é realmente difícil e inalcançável como um absoluto. Mas tentando um encontro com meu eu artista -que pouco espaço teve no meu passado-, ocupado como estava da labor de interpretar os interesses de outros. A coletividade não estava me permitindo encontrar esse espaço. Acredito que, como assinala Gaston Bachelard, "A solidão é necessária para nos desvincular dos ritmos ocasionais". Além disso, o filósofo francês diz que "Ao nos colocar diante de nós mesmos, a solidão nos leva a falar conosco, a viver assim uma meditação ondulante que repercute por todas partes suas próprias contradições e que procura incessantemente uma síntese dialética íntima". Eu espero que a encenação que está se formando nesta pesquisa alcance esse estado de síntese dialética. 
Sim, venho do país da criação coletiva. Minha pesquisa não se separa de jeito nenhum da minha tradição teatral. De fato, ela é quem me permite esta licença. Com esta solidão, estou fazendo uso do meu direito ao no man's land, àquela segunda existência que Jean François-Lyotard considera fundamental para se encontrar consigo mesmo e que pode ser entendida como aquele direito a permanecer separado, a não ter que responder aos outros. Já chegará o momento do encontro com o público. Daqui a pouco terão notícias disso.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

O palco teológico

Depois de uma breve conversa com o ator baiano Thiago Carvalho, fiquei pensando nas possíveis interpretações do propósito deste projeto. Vários assuntos ficam por se resolver. Da troca de ideias com Thiago, a anterior citação de Denise Stoklos foi um dos pontos que mais ressonou em mim. "O que é isso de que você é capaz de tudo?", perguntou Carvalho. Uma crítica à autosuficiência apareceu naquela pergunta. Querido Thiago, minha intenção não é criar um teatro da autosuficiência nem da individualidade (várias pessoas, no começo do projeto, acharam que essa era minha busca). Os versos de Stoklos só falam de um impulso por quebrar as regras de nosso teatro, de uma força que possibilita uma liberdade criativa das dictaduras e as hierarquias nas quais os atores acabam sendo simples intérpretes das ideias de outros. Quando pego as palavras de Stoklos, realmente estou invocando uma força criativa que vai me permitir levar ao palco minhas próprias perguntas. É no palco onde perigosamente estou achando que sou capaz de tudo...
Para fechar esta postagem, gostaria de trazer as palavras de Jacques Derrida falando do teatro da crueldade de Antonin Artaud. Acho que suas palavras traduzem muito das intenções deste projeto e apresentam aquele teatro do qual "O ator em solidão" tenta se libertar.

O palco é teológico enquanto for dominado pela palavra, por uma vontade de palavra, pelo objetivo de um logos primeiro que, não pertencendo ao lugar teatral, governa-o a distância. O palco é teológico enquanto a sua estrutura comportar, segundo toda a tradição,  os seguintes elementos: um autor-criador que , ausente e distante, armado de um texto, vigia, reúne e comanda o tempo ou sentido da representação, deixando esta representá-lo no que se chama o conteúdo dos seus pensamentos, das suas intenções, das suas ideias. Representar por representantes, diretores ou atores, intérpretes subjugados que representam personagens que, em primeiro lugar pelo que dizem, representam mais ou menos diretamente o pensamento do "criador". Escravos interpretando , executando fielmente os desígnios providenciais do "senhor". (2001, p. 343)

DERRIDA, Jacques. O teatro da crueldade e o fechamento da representação. In: _______. A escritura e a diferença. São Paulo: Perspectiva, 2001. cap. 8, p. 339-365.

domingo, 20 de janeiro de 2013

Três pontos de partida


O projeto O ator em solidão tem três motivações principais. A primeira é criar um espetáculo que possa se aproximar de uma problemática que me interessa de maneira pessoal: a falsa moral de uma sociedade que "aceita" a homossexualidade sempre que ela não seja desvelada. A segunda é experimentar a possibilidade de me liberar das formas já aprendidas de fazer teatro. A última é criar uma peça teatral da minha autoria sem ter que renunciar ao meu ofício de ator. Esses três pontos de partida encontraram eco em três figuras que considero verdadeiras descobertas estéticas: André Gide, Gaston Bachelard e Denise Stoklos.
Gide me deu a inspiração a partir da história de Miguel, um jovem que, depois da morte da sua esposa, decide reunir seus amigos para contar uma intimidade antes oculta. Isto acontece no romance O inmoralista. Também, deu para mim um interesante tratado sobre a homossexualidade (Corydon) e um belo relato erótico (O pombo torcaz) publicado post mortem pela sua filha. Mas, o maior presente de Gide foi o grande estímulo que pode se ler nesta frase da introdução do romance citado: "Na verdade, em arte não existem problemas dos quais a obra de arte não seja suficiente solução".
O segundo autor, Bachelard, foi aquele que me confirmou que a solidão era o caminho certo para minha busca por uma nova forma de criar. A solidão, exaltada de inúmeras maneiras nos seus textos sobre a imaginação, é aquele espaço onde o sonhador encontra o terreno apto para a criação.
A última, a atriz brasileira Denise Stoklos, oferece-me o último impulso. Por que não ser autor de minha própria obra? Por que não posso criar, encenar, interpretar e coreografar meu próprio teatro? Seu teatro essencial me dá essa força.
E vocês, meus leitores? O que acham de tudo isso? Tenho leitores já? A solidão é uma metodologia de criação teatral neste experimento, não um desejo de isolamento. Estão abertas as portas para suas opiniões, recomendações, dúvidas...


domingo, 13 de janeiro de 2013

Como nasceu o projeto O ator em solidão?





 

O projeto O ator em solidão nasceu da minha experiência em 2010, quando fiz meu primeiro monólogo. No início, a ideia de fazer uma peça teatral na qual um só ator estava em cena era uma possibilidade longínqua e correspondia a uma fascinação pelo trabalho de outros atores. Também, era uma parte do que tem relação com um trabalho da dramaturgia que eu conhecia mais profundamente através de meus estudos de literatura. Por isso, quando eu decidi fazer La navidad de Harry (2010), de Steven Berkoff, tive a necessidade de pensar de novo sobre o que o ator faz no palco. Todos os espetáculos que tinha feito até esse momento eram muito diferentes do que fiz no processo de encenação da peça de Berkoff porque eu sempre trabalhei sob o pressuposto do trabalho coletivo como elemento fundamental do teatro.
A experiência teatral que eu tinha até 2010 foi o resultado de um trabalho com diferentes grupos de teatro. O principal foi Íntimo Teatro. Este foi o primeiro grupo em que tive um trabalho profissional de vários anos como ator. Seu diretor artístico, Carlos Bolívar, foi meu professor na Escola de Teatro da Universidad de Antioquia. Ele ensina e trabalha em cena principalmente com a técnica das ações transformadoras de Jorge Eines, a qual define o trabalho do ator a partir da interpretação do texto dramático e considera a ação física como um elemento transformador da cena. Posso dizer que Íntimo Teatro foi, depois da universidade, minha maior escola de formação. As peças que trabalhamos nesse grupo foram de diferentes gêneros e estavam baseadas no trabalho dos atores como elemento principal da cena. Uma das últimas peças que eu fiz com Íntimo Teatro, Palabras encadenadas, de Jordi Galcerán, onde a ação é desenvolvida o tempo inteiro com uma atriz que sempre me acompanhou em cena, ensinou-me, por exemplo, sobre a transformação de minha função como ator a partir do trabalho do outro.

Palabras encadenadas, de Jordi Galcerán. Direção: Carlos Bolívar.
Atores: Gloria Montoya e Juan David González.

Tudo isso aconteceu em Medellín, cidade onde nasci. No entanto, já há alguns anos que morava em Bogotá. Nesta cidade, fiz algumas coisas com outros grupos de teatro, mas não consegui fazer o tipo de teatro que eu queria. Por isso, no ano de 2009, comecei a procurar atores para aprofundar no meu próprio projeto. A empresa não deu certo e fiquei sem conseguir iniciar nenhum projeto teatral por vários meses. Sem a possibilidade de conseguir uma equipe de trabalho coletivo, a solução que encontrei foi a encenação do monólogo La navidad de Harry.

La navidad de Harry, de Steven Berkoff. Direção: Carlos Bolívar.
Ator: Juan David González Betancur.

Quando comecei com esta montagem, soube que a experiência ia ser difícil. Estava sozinho em cena. Ninguém estava no palco para me “transformar” e eu não tinha ninguém naquele cenário para “transformar”. Onde ficou tudo aquilo que eu aprendi? Na solidão apareceram mais dúvidas do que certezas e, naquele momento, pensei sobre a solidão do ator, desejei fazer disso uma pesquisa mais longa e criativa e descobri uma questão estética verdadeira que eu gostaria de desenvolver. Essa questão pode se definir como um sistema de trabalho artístico em que o ator realiza um exercício de criação autónoma, sem ter que passar pela intervenção de uma voz externa (seja de um diretor ou de um dramaturgo) e que transforma seu papel de intérprete. Acostumado como estava a trabalhar numa técnica que relaciona o trabalho do ator com a tarefa de representar as intenções do autor do texto teatral através da guia do diretor cênico, a solidão que experimentei fazendo a peça de Berkoff me convidou a me liberar ainda mais.
Depois disso, pensei que a solidão não seria daqui para frente uma solução, mas uma nova maneira de entender meu trabalho artístico. Pensei em um ator contemporâneo que pode prescindir dos outros papéis tradicionais das artes cênicas e ter a autonomia de outros artistas. Um ator que não depende de um diretor nem de um texto dramatúrgico anterior para fazer seu trabalho em cena.
Por isso, minha pesquisa vai partir da consolidação de um projeto de criação que eu já tinha pensado há algum tempo, exercício que se conecta diretamente com temáticas que eu gostaria de apresentar e que não foram tratadas por nenhum dramaturgo conhecido por mim nem da maneira que eu gostaria. Trata-se da montagem de uma peça teatral inspirada na obra literária de André Gide, especialmente nos textos O imoralista (1972), O pombo torcaz (2009) e Corydon (1969). A obra de Gide aprofunda a questão da homossexualidade desde vários olhares que coincidem com minhas próprias visões, assunto que há muito tempo desejo levar ao palco.
O leitor deste blog encontrará todas aquelas perguntas que possibilitaram a encenação do meu primeiro monólogo e o início de uma pesquisa que estou desenvolvendo nos meus estudos de doutorado, a qual combina a reflexão teórica com o exercício artístico para procurar uma maneira de mudar a ideia mais tradicional que se tem do ator como intérprete e pensar o ator como autor. Aquilo que começou como uma solução para uma situação de solidão real se converteu em uma questão estética sobre os alcances criativos do ator.